segunda-feira, 26 de junho de 2017

O corpo gay que envelhece invisível

Numa sociedade neoliberal capitalista, a meritocracia torna o idoso um ser invisível: improdutivo, inapto, invisível e...Sozinho.
A condição piora quando este idoso é homossexual. 
Cansado de lutar contra a ditadura da beleza, o corpo gay cede, inevitavelmente, ao tempo. Perde a graça e o glamour que o caracteriza e se dissipam as amizades de tempos gloriosos das festas e risadas, regadas à promessas de juventude e amor eternos: promessas que findam em quartos de asilos, de apartamentos lúgubres com memórias póstumas de energias radiantes e coloridas. 
O corpo do idoso gay é um museu da alegria, túmulo da felicidade de amizades e amores efêmeros, frutos da descompassada orgia líquida da busca pelo amor. Na guerra cotidiana do vale-quem-produz, a moeda de sucesso é a juventude. 
Procedimentos cirúrgicos e hormônios tentam retardar a realidade inescapável da gravidade e do tempo. O corpo gay dança feliz na balada espaço-temporal e, sem preparo, termina a noite à luz do dia com o corpo idoso. Não há volta. E esconder-se da luz nos armários da solidão é o maior medo: talvez, razão que conduz à busca irrefreável de amor e companhia.
Não temos filhos.
Não somos eternos. Ninguém é: gay ou não.
No desespero em busca de amor, esquece-se do futuro: e o futuro é estar bem, mas só. E, na condição de gay, só é sempre sinônimo de frágil, pois, para a sociedade meritocrática da juventude eterna, não há nada mais decadente e desnecessário do que uma "bicha velha". É preciso escondê-la, pois a "bicha velha" precisa ser invisível. Ela incomoda, porque representa tudo o que o mercado detesta: a decadência da beleza e da alegria dos amores juvenis, que reinam na balada da vida e gerenciam a continuidade sistêmica do consumo de cosméticos, moda - e de valores pueris, que persistem na qualidade de ingressos à um mundo onde seremos mais aceitos.

Reflexão feita a partir da leitura do matéria de Víctor Usón para o jornal El País, intitulada "Na terceira idade, o gay volta para o armário para sobreviver", publicada em 24/06/2017.

http://brasil.elpais.com/brasil/2017/06/23/internacional/1498191350_245967.html

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